No princípio de cada ano aí os temos, os presidentes da República a enviar mensagens, com votos de um bom ano. Os cidadãos vão ouvindo, cada vez menos, mas lá vão emprestando um ouvido no meio do habitual "zaping". Este ano, graças às guerras entre as televisões, não foi necessário um ouvido inteiro - meio chegou - para ouvir a comunicação de Sua Excelência. Somados os excertos que se foram anotando aos pedaços de prosa lidos nos resumos da impensa, a conclusão parece óbvia: não foi neste homem que os portugueses votaram para presidente da República.
Este não é o dr. Jorge Sampaio, que chegou a ter o cognome de "Rocard português", este homem preocupado com as contas do Estado, tal como os partidos e os economistas lhas apresentam não é o político brilhante de há doze ou quinze anos atrás. Também ele se deixou amolecer na convivência fácil com os verdadeiramente poderosos, que se apoderam da riqueza criada pela labuta diária dos portugueses - a quem o presidente dirige as mensagens. Também ele deixou de fazer as perguntas certas e nos atira com as mesmas palavras usadas por todos os outros que têm acesso às televisões, aos jornais, às rádios: "competitvidade", "produtividade".
Também ele faz o apelo ao entendimento entre os partidos de poder em Portugal, esquecendo-se - como? - de que eles estão coligados há mais de vinte anos, com os resultados que se conhecem: um país cada vez mais pobre, com cidadãos cada vez mais incultos, cada vez menos informados; um país com cada vez menos perspectivas de garantir à sua gente melhores condições de vida, mas com dirigentes políticos a quem, de repente, são detectadas contas secretas na Suiça.
Também ele faz o apelo a medidas que diminuam as despesas na saúde, esquecendo-se de referir a necessidade óbvia de verificar as relações entre os vários agentes que têm a responsabilidade da sua manutenção e administração, incluindo laboratórios farmaceuticos e o Ministério da Saúde, na sua globalidade.
Também ele faz apelo aos pactos sociais, esquecendo a evidência da necessidade de reestruturação do empresariado nacional, exigindo-lhes o pagamento dos impostos devidos, a actualização de métodos de gestão, a actualização tecnológica; esquecendo os números que indicam os gestores portugueses como os mais bem pagos da União Europeia.
Também ele se esquece de exigir que as autoridades do chamado bloco central, que governam, há mais de vinte e cinco anos, as estruturas da Educação, parem de desenvolver esquemas para cumprir números exigidos pela União Europeia e introduzam no sistema educativo normas de verdade, regras de disciplina, de rigor na avaliação, obrigando os nossos jovens a perceber que não se aprende sem esforço, que não se pode viver em sociedade sem respeito pelos outros.
Que presidente é este que apela aos pactos sociais em nome da competitividade e se esquece que os portugueses são, na Europa, os que mais trabalham e menos ganham?
Não foi neste líder que eu votei. Eu votei num homem a quem reconhecia qualidades excepcionais, capaz de, nesta altura, ter a coragem de dizer: o que está mal é a injustiça galopante que a globalização tem vindo a criar. Temos que lutar para que, pelo menos no espaço em que nos inscrevemos, na União Europeia, termine a ideia de que as empresas têm que apresentar, todos os anos, mais lucros do que o ano anterior. Temos que derrotar o deus "lucro".
Sr. Presidente, há mais vida para além da competitividade! E há mais verdades para além da dos contabilistas.
1 comentário:
Mais que a estafada versão dos consensos, o país precisa é de verdadeiras roturas. Mais que juntar, há que apartar, marcar a diferença, caminhar noutras direcções.Acho estranho e perturbador que não se fale desta necessidade evidente de separar as águas. Entretanto, falam os tôlos, escutam os tôlos. Verdadeiramente escutamos histórias de sexo entre anjos.
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