terça-feira, janeiro 18, 2005

O País dos Primos

Não sei como, um dia destes, uma das televisões portuguesas abriu a antena para o Engº. Melancia, ex-governador de Macau, falar sobre a questão ingente das relações comerciais entre Portugal e a China. Isto, ao mesmo tempo que Jorge Sampaio, viajava para o Império do Oriente, acompanhado de uma comitiva recheada de empresários, e um sindicato, usando um porta-voz façanhudo, daqueles que ainda gritam "viva o marxismo-leninismo", responsabilizava, noutra televisão, o Presidente da República pela deslocalização de empresas do território nacional.
Ora aqui está matéria para uma semana de debate , mas entre gente interessada em analisar problemas e deixá-los, pelo menos, em equação e não entre cavalheiros dispostos a mostrar-se aos próximos patrões.
Queixou-se o engº. Melancia de que nunca se quis saber, em Portugal, das relações com China e do canal privilegiado que Macau representava para o seu desenvolvimento. Disse mais ainda: que nunca tinha sido perguntado pelo que quer que seja ácerca da China, ele, um conhecedor da realidade chinesa, um homem com uma experiência assente num quotidiano de grande exigência.
Ninguém ouviu o Engº Melancia, assim como ninguém ouviu outro dos muitos governadores de Macau. Em Portugal há sempre um primo, ou o amigo de um primo, ou da namorada do primo, ou a própria namorada - a pessoa ideal a quem perguntar, a quem dar um emprego bem remunerado - sobretudo se não tiver trabalho para fazer.
Sr. Engº Melancia: é um mal da nossa terra. Percebeu se alguma entidade com responsabilidades na gestão das relações de Portugal com África tivesse tido a preocupação de perguntar o que quer que fosse aos milhares de quadros - muitos deles altamente qualificados - que vieram das ex- colónias e aqui tiveram que se instalar.
O que é que se passou com esse "know-how"? Muito dele colocou-se ao serviço do estranheiro e o outro esqueceu o que sabia e habituou-se a ser primo. Os que ainda tinha idade fizeram-se de primos da namorada.
Qual é o conhecimento que Portugal tem hoje das realidades africanas? Muito pouco, porque, entretanto, as namoradas e os primos delas descobriram uns empregos simpáticos, que davam umas viagens aos trópicos, sobretudo no Inverno.
Com estas idiossincrasias não admira que os nossos empresários também não estejam muito interessados em gente com ideias lá nas suas empresas. Assim como assim, eles sabem um pouco de tudo e sempre se vão desenrascando. Mais subsídio, menos subsídio, sempre fogem à exigência dessa gente com ideias que quer alterar tudo e "acompanhar o Mundo... e essas coisas".
E, depois, o Presidente quando viaja sempre leva alguns deles e...sempre há uns programas livres: Por mais que o Presidente fale e explique, não entendem: foram convidados porque são pessoas importantes. Estudar os mercados ? Saber se é possível vender na China? Mas, então isso tem algum jeito? O Estado há-de dar. Se não for o Estado, sempre há Deus, e Braga, a cidade dos Arcebispos, onde se pode rezar a todos os santos.


1 comentário:

pindérico disse...

Gostei.
Gostei muito!
Bateu bem na "mouche". Somos um País de iluminados !!!