quarta-feira, março 16, 2005

"As Terríveis Questões" Portuguesas

Dois Jornalistas- ainda os há, e dos que não abdicaram da função mais nobre do jornalismo, opinar - na edição de hoje do "Público" tratam, cada um à sua maneira, a questão da confiança da sociedade portuguesa.
Tereza de Sousa, pelo seu lado, e muito bem - em texto que seria um ponto de partida excelente para a discussão da natureza do poder que nos rege, da sua fundamentação e legitimação - verbera o facto de o Estado, na sua versão mais visível, a Administração, tratar o cidadão comum como gente que não merece confiança, passando-lhe, permanentemente, "um atestado de menoridade.
A articulista demonstra, exemplificando, que essa desconfiança sistemática não é apenas uma manifestação de menor respeito pelos direitos dos cidadãos, mas também se traduz em prejuizos para todos nós. A conclusão deste texto pode ser a de que valeria a pena tentar uma administração baseada na confiança e assente no princípio de que cada cidadão é uma pessoa de bem, contrapondo às excepções pesadas punições legais.
Pelo seu lado, José Vitor Malheiros analisa o discurso de tomada de posse de José Sócrates, acompanha os vários raciocínios tornados públicos sobre a nomeação de Freitas do Amaral como ministro dos negócios estrangeiros, acabando por desvalorizar a argumentação que se lhe opôs e debruça-se, igualmente, sobre a medida concreta apresentada pelo primeiro-ministro quanto à venda livre de medicamentos não sujeitos a receita médica.
Malheiros concorda e desmonta os argumentos falaciosos daqueles que se opoêm à medida.
Todavia, no final do texto, num ponto 3, Vitor Malheiros levanta aquilo que considera "uma terrível questão" que é a de saber se estas decisões de Sócrates indicam "sinais de uma vontade ao serviço de uma estratégia (qual?)" ou não passam de "gestos avulsos apenas decididos pelo desejo de marcar agenda mediática, surpreender o homem da rua, entreter os comentadores e gerir o status quo".
Este é o outro lado da nossa marca cultural: a desconfiança dos cidadãos em relação a quem exerce o poder.
Um desconfiança que, obviamente, tem um preço a pagar também pelos cidadãos, porque esta desconfiança sistemática em relação aos agentes políticos, em vez de os punir desresponsabiliza-os.

1 comentário:

Lyra disse...

Sim, sim de facto tem razão.
Sempre ouvi dizer que quem não confia, não é de confiar. Parece este nosso Portugal, em que anda meio mundo a desconfiar do outro meio mundo.