domingo, julho 03, 2005

Narciso

Abro o portão, olho a relva, noto o excesso de sol, a falta de água. Desvio os olhos e reencontro o narciso. Assento os pés na pedra e deixo-me fascinar pelo amarelo . Poiso a mala e deixo-me enlevar. Parado, olho dentro de mim e descubro-me naquela flôr - tão frágil - ameaçada pela seca, sobrevivente, quase a gritar-me. De repente, noto, que além de amarelo, o narciso, que eu próprio plantei há meses, é também vermelho, um círculo, bem marcado.
Sento-me aturdido. Aquela flôr afronta-me.
Que fazer?
Recupero a mala, entro em casa. Procuro água, lavo as mãos, o rosto e ergo os olhos: no espelho está o vermelho do meu narciso, a rir do meu incómodo. Volto ao jardim e colho a flor. Coloco-a numa jarra com água. Tenho a certeza de que aquele vermelho desmaiará com o tempo.

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