sábado, outubro 08, 2005

EU VI MARCEL CERDAN

Fui ver no Coliseu. Era peso médio, mas pespegaram-lhe com um meio pesado na frente: Agostinho Guedes. Foi uma aventura. Nesse tempo eu era um miudo de escola e era um desportista de jornal. Sabia do Cerdan campeão, de título mundial, quase tudo. E quando soube do combate em Lisboa esfalfei-me para arranjar guita para uma geral no Coliseu. Cravei toda a gente do meu mundo e, na véspera, lá fui para a fila comprar o bilhete.
O dia nunca mais passava. Mas, à noite, a sala transbordava. O ambiente do Coliseu a abarrotar.
Fumarada, porque se fumava muito, nesse tempo, e por todo o lado. Houve uns combates para entreter e aumentar o apetite.
No intervalo, antes do combate, estava cheio de sede. Deixei o lenço no degrau e fui ao bar, repleto de gente adulta, mais alta e encorpada, mas lá tive o pirolito e voltei para a sala, em marcha lenta, que os gongos tiniam. Logo à entrada da sala, avistei o Agostinho já no canto e o Cerdan a subir entre cordas para o ring. Acelerei para o lenço. Vi os dois junto do árbitro apertar as mão. Fiz mais um esforço para passar por um chato que não deixava passar e lá estava já a pegar no lenço quando oiço o bruá-á tremendo e viro-me. Agostinho Guedes deitado e o árbitro ia gesticulando com braço e um dedo estendido e oito sacudidelas depois, cruzou os braços, virou-se e levantou um braço de Marcel Cerdan. Não vi o soco. Não vi nada, a não ser uns segundos antes, quando os dois se tocaram com as luvas. Era uma barulheira à minha volta e eu sentia lágrimas nos olhos.
No dia seguinte, no campo do Benfica, voltei a ver o Cerdan, vestido de gente comum. Foi levado ao meio do campo de terra batida e levantou o braço e recebeu uma ovação. Não bati palmas. Ainda não sabia o que era frustração e fiquei com vergonha de falar do assunto.
Os jornais desportivos iam dando novas do campeão. Em França ele perdeu o combate com o norte-americano, suponho que era o Vilemain. Durante o combate estragou uma das mãos e não
permitiu o combate desforra muito depressa. Depois, já refeito, teve de gramar as evasivas do novo campeão, que aparentemente não se sentia muito seguro de si. Quando finalmente se aprazou o combate, desta feita nos Estados Unidos, gerou-se grande expectativa. Edite Piaf que andava de namoro, meio escondido, com o boxeur, foi dar espectáculos nos states. Mas ela ainda teve mais azar que eu: nem houve combate. O avião ficou-se pelo caminho, sem sovreviventes.
Nunca mais fui ao box. O mais próximo que estive foi um combate para um título mundial, que teve lugar em Kinshasa. Tive convite e até hesitei, mas não fui. Mas correu tudo bem e os que foram gostaram o combate e do passeio...

2 comentários:

Anónimo disse...

Conheci o A. Guedes. Era um bom tipo. Ia aos bailes da FNAT na Costa com uma bonita namorada que tinha uns olhos da cor dos da Elizabeth Taylor.
Serão vivos ?
Em Kinshasa? Grande espectáculo!
Muhammed Ali derrotou por KO Georges Foreman ganhando o título mundial num combate que ficou conhecido por "rumble in the jungle".

Anónimo disse...

Morreu em 1996 nos EUA