segunda-feira, março 27, 2006

FAZ DE CONTA...

Se o trabalho desse saúde, os hospitais não seriam precisos para nada. É o ponto de vista mais à mão do amigo do alheio, que também alega que só trabalha quem não sabe fazer mais nada. Mas em boa e honesta verdade o desemprego não é brincadeira e a crise no mercado de trabalho começa a tornar-se dramática. Crise económica, diz-se. Não sei, não entendo! No antigamente, os cafés que vendiam a bica a dez tostões, e depois a quinze, floresciam e a Baixa estava cheia deles. Sofri quando começaram a desaparecer, engolidos pela Banca. Foi a vez das pastelarias, além de bolos e pasteis, venderem cafés e esplanadas e toda a espécie de águas adocicadas. E também algumas foram à vida, que outro poder mais alto se alevantava. Por essa altura fiz como fazem agora os chineses: abalei.
Mas, como cantou o fadista, por morrer uma andorinha não acaba a Primavera e como nunca se deixa de sonhar o mundo pula e avança, bem lembrou o poeta. E, hoje, são os bancos a mudar, a engolir-se uns aos outros e as suas lojas a fechar, a fechar, umas atrás de outras. Qual crise, qual carapuça. Os bancos nunca ganharam tanto! Ora se os bancos ganham porque raio de coisa têm de ser os trabalhadores que ainda trabalham a pagar a crise? Há, na actualidade, menos bancos e, sobretudo, menos bancários, varridos pela idade ou por acordos vários, mas o negócio prospera.
A filha telefona-me e ralha: «Tu não falas das manifs em Paris. Dos despedimentos da lei
Villepin»?
Ora! Ela que fale. Ela é que é de lá. Estou mais interessado no que diz o Paulo Bento. Já nem saúde tenho para o Marcelo e nem sei se alguém tem. Fiquei lixado, lá isso fiquei. E o pior foi que, mais à noite, num programa desportivo francês, conduzido por uma pequena, que nem vos digo! Não foi isso. «Isso» é só bom para levantar o moral; foi a seguir. O director do «Le Point»
botou conversa sobre uma livralhada, um mais daqueles books que os directores não resistem a escrever, as mais das vezes para se dar ares. Mas ele contou um rumor, meio restrito, que dava conta de uma manobra suja, posta a circular para denegrir o pluri denegrido Sarkosy, a qual teria sido maquinada e difundida pelo já citado Villepin. Façam o favor de acreditar que não sou expert em política parisiense, mas nem é preciso para entender que o alvo não era o primeiro ministro, mais ou menos interino, versão gaulesa de Santana Lopes, mas o «senhor» de cima!
Não sei, nem discuto a lei dos despedimentos. Há uns anos esbarrei com «Intermittants du spectacle», uma forma ardilosa de pôr a trabalhar sem vínculo uma classe de trabalhadores. O resultado foi o abuso sobre os que precisam de trabalhar e alargou-se o número de desempregados. Eu conhecia o princípio. Conheci-o em Portugal, a seguir ao 25 de Abril. A festividade proíbia os despedimentos e não demorou a quase paralizar alguns sectores laborais, designadamente a construção civil. Não se podia contractar um pedreiro ou um servente para uma obra. Não havia maneira de se livrar deles, depois. A instabilidade foi crescendo e flagelou
praticamente todo o mercado de trabalho. E foi, se bem me lembro, o primeiro governo de Mário Soares a relançar o mercado e empurrar o país com o implante dos contractos a prazo. Não adianta arreganhar os dentes ou vociferar. Foi a medida adequada na altura. O abuso veio depois e curiosamente até da parte do Estado, que usou e abusou dos contractos a prazo, muito para além dos limites estabelecidos, que eram de dois anos. Mas tinha alguma razoabilidade: as leis laborais atribuiam todos os direitos aos presumíveis trabalhadores e a totalidade dos deveres aos empregadores. Daí que não poucas reformas tenham tido o cunho de quase vingança. Bom, mas disto sabemos todos, os que por cá andamos, assistindo ao encerramento das industrias e a sua transladação para a China, ao mesmo tempo que os chineses emigram para a Europa, onde podem importar à fartazana os frutos da tecnologia ocidental, made in China, a preços de uva mijona...