Madrid. Faltam 15 minutos para 18 horas. Calle de La Salud. Uma pequena multidão de homens e mulheres já muito para além da chamada terceira idade faz uma fila, no passeio e para baixo de uma porta que, em grandes painéis, anuncia "Baile Estilo Orquestra".
À volta da praça, com um pequeno jardim e uma esplanada, há pequenos círculos de homens com idades comparáveis à dos que permanecem na fila. De todos os lados da praça aparecem mulheres bem arranjadas, pintadas, vindas do cabeleireiro há poucos instantes. Aos pares. Também há casais, que, por vezes, trazem "de pendura" uma amiga.
Junto à entrada, o porteiro, um homem dos seus trinta e poucos anos, olha com ar divertido os seus "clientes", vai conversando com os que estão mais perto e às 18 horas em ponto dá a ordem de partida. Em pequenos grupos, homens e mulheres vão entrando. Eles, com gestos calculados, levam a mão ao bolso interior do casaco, elas metem a mão nas carteiras. A maior parte delas leva um saco nas mãos. Alguns deles - poucos - também.
A partir daquela hora e por muito mais tempo , chega gente de todos os lados, de Taxi, a pé, mas com um único objectivo: entrar naquela porta.
Muitas das senhoras que ali vi tinham, seguramente oitenta anos, ou perto. Alguns deles também.
Reparei especialmente num senhor, bem vestido, com casaco e calças claras, camisa azul escura e uma gravata também azul, muito clara, e que permaneceu longo tempo, com ar tímido, de verdadeiro adolescente, a olhar os outros que, afoitamente, entravam na sala do baile, "tipo orquestra". Era dos mais novos.
Estaria à espera que a dama dos seus sonhos chegasse?
Avaliaria ele, no seu conjunto, a frequência daquele dia?
A verdade é que tinha um ar triste, a contrastar claramente com o tom da roupa que vestia.
De repente, surge em cena um cavalheiro com um fato entre o castanho e o amarelo, com uma camisa salmão, aberta, de cabelo completamente branco, de tez bronzeada. Pára à beira da porta, encosta-se à parede, olha em redor, pucha de um telefone portátil e, pouco tempo depois de ter trocado meia dúzia de palavras, entrou decidido naquilo que só pode ser um salão enorme - tanta gente lá entrou.
Na fila inicial há uma figura de banda desenhada: fato branco, camisa preta e gravata branca, cabelos compridos completamente brancos, tem um olhar dominador. Pressente-se nele uma cabeça agitada pelas recordações de outros tempos em que faria rodopiar nos braços as mais belas de Madrid.
Na Calle de La Salud, a caminho da Gran Via, aparece um cavalheiro de cabelo e barba brancos, com ar distinto, olhar dirigido para lá do horizonte, a fumar com gestos estudados noutros tempos. Apoia-se numa bengala e permanece longo tempo a observar o movimento gerado em direcção ao "Estilo Orquestra". Passeia pelas mulheres que chegam um olhar enfastiado. Dá alguns passos em direcção à porta, ainda do outro lado da rua, mas, lentamente, um pouco mais tarde, atravessa a rua e, quando tudo indicava que iria entrar, passou ao lado, descendo em direcção à Alcalá.
Entre aquela gente de tanta idade, mas ligeira, algumas menos idosas e muito mais ligeiras conseguiram entrar no recinto. Percebeu-se que são conhecidas do porteiro, que, todavia, impediu a entrada a um grupo de três mulheres de origem africana que se faziam acompanhar de um jovem que ostentava um boné. Fiquei sem saber a razão da proibição. Talvez fosse o boné do jovem...
E quis saber o que era aquilo. Um madrileno bem disposto explicou-me que era "um baile para maiores de oitenta" e que acontecia todos os sábados e domingos. Reunia-se ali uma verdadeira multidão de gente com idade para desejar estar em casa e "bailam, bebem, riem, cantam, sentem-se acompanhados... e alguns arranjam companhia para o resto da vida..."
Um dia destes - contou ele - morreu um velho com oitenta e três anos; dançou muito e o coração não aguentou, veio a ambulância, foi uma tristeza, mas o baile continuou. Toda a gente que estava lá dentro pensou o mesmo: morreu feliz.
4 comentários:
Bailaban al son de Viaje con nosotros si quiere gozar, Ponte la peluca ya, Ola mi amor, tu eres mi lobo......
Los paseos del doctor Mario Soares por el Retiro de Madrid
dos 80 p cima tb se tem direito à vida ; ) HAHAHAHAH!
E a botar peidos sulfurosos....
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