Como o comum das criaturas do meu tempo, fui para a escola aos sete anos. Já vos devo ter contado que tive um prof. trasmontano e tinha um presidente do Conselho de Santa Comba.
Um colega de carteira haveria de malhar com os ossos na Índia. Da confusão só teve o prelúdio. A parte dura seria depois, já ele regressara ao Século, onde trabalhou nas oficinas. Ainda a tempo da guerra que por lá estalou, quando o governo de então tinha metido «o socialismo na gaveta», para entre outras coisas fechar o jornal dos sapateiros e publicações afins, numa das cujas directava Natália Correia. O então ministro Alegre, também poeta, diria nas vésperas que o «Século» não podia fechar.
Já me perdi. Estava na escola para aprender a ler, mas comecei a falar disso por mor dos electricos. É que, de vez em quando, com uma «croa» (cinco tostões) lá ia até ao Conde Barão.
Havia, claro, outros mais desembaraçados que se penduravam no estribo e os cinco tostões davam para duas doses de tremoços. Aquilo dos eléctricos era negócio inglês. Não sei se era estúpido, mas tinha muita, muita gentinha a trabalhar. Começava cedo a circular e terminava pela madrugada. Havia, bem entendido, problemas de trânsito. Não que o tráfego fosse intenso. Durante a guerra na Europa os automóveis eram escassos e autocarros não os havia na Carris. A chatice advinha dos burros, cavalos ou éguas que puxavam carroças e que, por vezes, caiam sobre a linha, causando efervescência mais ou menos divertida e que também servia para justificar alguns atrasos.
E também havia comboios, que consumiam carvão. Nos comboios e nas estações deles também trabalhava muita gente, muita. Na minha terra, nesse tempo, podia-se ir até ao Porto ou a Sintra. E também a Cascais, mas nesta linha o comboio não ia a carvão e, nele, eu ia para a praia.
Na estação do Cais do Sodré havia muitas bilheteiras e para passar do hall de entrada para a gare, pelas diversas portas em cada qual estava um vigilante a vigiar as entradas.
Havia, é certo, outros circuitos à roda de Lisboa, que não conheci em pormenor.
Tal como os eléctricos, em Lisboa ou no Porto, os comboios desempenhavam um serviço público e eram economicamente rentáveis. Depois da guerra, quando a indústria automóvel irrompeu
em força, obrigando os governos a desviar verbas para construir estradas, auto-estradas e
outros caminhos asfaltados, foi sendo travado o desenvolvimento dos eléctricos citadinos bem como dos comboios urbanos ou interurbanos. Não se procurou conciliar, mas substituir. Foi assim até o caos se instalar.
As mudanças não ocorreram apenas nos meios e sistemas de locomoção, mas na economia de subsistência que se foi gerando e que levou ao esvaziamento dos empresas transportadoras e não só...
Além dos eléctricos, os ingleses exploraram por cá os telefones; mas os CTT também dispunham de redes. Quer os ingleses, quer os de cá, empregavam toneladas de criaturas. Deviam ser burros. Os novos directores-gerais, engenheiros, doutores e correlativos, acharam por bem reduzir os quadros ao mínimo possível. Nos transportes, por exemplo, só há alguns bilheteiros e muitas máquinas a fazer de. Nos comboios ainda subsiste o chefe da estação a agitar a bandeira e a apitar para a saída do Alpha ou do regional, mas no «metro» ou nos autocarros é só maquineta a controlar. Evidentemente que há muita balda e «eles» sabem. Sabem e contabilizam, agravando os preços. De facto esforçam-se por assegurar os sistemas de modo a travar os borlistas, mas estes também se esforçam, mas como a manutenção dos sistemas é onerosa e, claro, quem se lixa é o mexilhão. A opção pelos sistemas maquiavélicos não limita os custos empresariais, mas evita, isso sim, os diferendos laborais.
E vou voltar ao meu eléctrico de menino e moço. Custava cinco tostões quando ia para a primeira classe aos sete anos. Custou cinco tostões aos vinte anos, quando fui às sortes...
Um colega de carteira haveria de malhar com os ossos na Índia. Da confusão só teve o prelúdio. A parte dura seria depois, já ele regressara ao Século, onde trabalhou nas oficinas. Ainda a tempo da guerra que por lá estalou, quando o governo de então tinha metido «o socialismo na gaveta», para entre outras coisas fechar o jornal dos sapateiros e publicações afins, numa das cujas directava Natália Correia. O então ministro Alegre, também poeta, diria nas vésperas que o «Século» não podia fechar.
Já me perdi. Estava na escola para aprender a ler, mas comecei a falar disso por mor dos electricos. É que, de vez em quando, com uma «croa» (cinco tostões) lá ia até ao Conde Barão.
Havia, claro, outros mais desembaraçados que se penduravam no estribo e os cinco tostões davam para duas doses de tremoços. Aquilo dos eléctricos era negócio inglês. Não sei se era estúpido, mas tinha muita, muita gentinha a trabalhar. Começava cedo a circular e terminava pela madrugada. Havia, bem entendido, problemas de trânsito. Não que o tráfego fosse intenso. Durante a guerra na Europa os automóveis eram escassos e autocarros não os havia na Carris. A chatice advinha dos burros, cavalos ou éguas que puxavam carroças e que, por vezes, caiam sobre a linha, causando efervescência mais ou menos divertida e que também servia para justificar alguns atrasos.
E também havia comboios, que consumiam carvão. Nos comboios e nas estações deles também trabalhava muita gente, muita. Na minha terra, nesse tempo, podia-se ir até ao Porto ou a Sintra. E também a Cascais, mas nesta linha o comboio não ia a carvão e, nele, eu ia para a praia.
Na estação do Cais do Sodré havia muitas bilheteiras e para passar do hall de entrada para a gare, pelas diversas portas em cada qual estava um vigilante a vigiar as entradas.
Havia, é certo, outros circuitos à roda de Lisboa, que não conheci em pormenor.
Tal como os eléctricos, em Lisboa ou no Porto, os comboios desempenhavam um serviço público e eram economicamente rentáveis. Depois da guerra, quando a indústria automóvel irrompeu
em força, obrigando os governos a desviar verbas para construir estradas, auto-estradas e
outros caminhos asfaltados, foi sendo travado o desenvolvimento dos eléctricos citadinos bem como dos comboios urbanos ou interurbanos. Não se procurou conciliar, mas substituir. Foi assim até o caos se instalar.
As mudanças não ocorreram apenas nos meios e sistemas de locomoção, mas na economia de subsistência que se foi gerando e que levou ao esvaziamento dos empresas transportadoras e não só...
Além dos eléctricos, os ingleses exploraram por cá os telefones; mas os CTT também dispunham de redes. Quer os ingleses, quer os de cá, empregavam toneladas de criaturas. Deviam ser burros. Os novos directores-gerais, engenheiros, doutores e correlativos, acharam por bem reduzir os quadros ao mínimo possível. Nos transportes, por exemplo, só há alguns bilheteiros e muitas máquinas a fazer de. Nos comboios ainda subsiste o chefe da estação a agitar a bandeira e a apitar para a saída do Alpha ou do regional, mas no «metro» ou nos autocarros é só maquineta a controlar. Evidentemente que há muita balda e «eles» sabem. Sabem e contabilizam, agravando os preços. De facto esforçam-se por assegurar os sistemas de modo a travar os borlistas, mas estes também se esforçam, mas como a manutenção dos sistemas é onerosa e, claro, quem se lixa é o mexilhão. A opção pelos sistemas maquiavélicos não limita os custos empresariais, mas evita, isso sim, os diferendos laborais.
E vou voltar ao meu eléctrico de menino e moço. Custava cinco tostões quando ia para a primeira classe aos sete anos. Custou cinco tostões aos vinte anos, quando fui às sortes...
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