terça-feira, fevereiro 28, 2006

POBRE MEXILHÃO

Este ano, se ainda for a tempo, vou tirar um curso. Um curso bem difícil, por sinal: ler e entender os jornais diários deste país. Semanários não conta, mesmo que se entendam são caros e chatos para quem não disponha de lacaio para carregar o lixo!
Por vezes esforço-me por entender, sobretudo as manchetes, que nem precisam de óculos. É verdade, reconheço, que alguns dispõem de cronistas brilhantes, através dos quais, dias depois, se entendeu alguma coisa do que o corpo de jornal «gritou» dias antes. Mas é, convenhamos, uma maneira laboriosa de chegar ao assunto.
Ainda recentemente li algo sobre o Presidente se dispor a condecorar o último dos moicanos, o que permitiu ao poeta da Rosa ir a Belém, antes de chegar à fala com o patrão que lhe roeu a corda. Para inchar a notícia fez-se um resumo alargado do que, decerto, estaria nas entrelinhas. E lá veio a sobreposição de Sócrates sobre Alegre, na noite das eleições. E lá veio o atropelo de que Golias abusava e que David se viu coagido a ultrapassar.
A história, claro, tem sido mal contada. Não foi o primeiro-ministro que pulou sobre o rebelde socialista, foram as cadeias de televisão que fizeram a opção, que se estiveram borrifando. Não vou afirmar que o fizeram por subordinação ou dependência. Por estupidez, isso, sim, disso não restam dúvidas. Para amarfanhar o «grande vencido» atropelaram o único ileso da esquerda tresloucada.
Mesmo assim, o primeiro-ministro deveria ter dirigido uma censura pública ao servil canal televisivo do Estado e desse modo evitado que os matutinos tratassem o incidente como quem lava roupa suja..
Também é justo salientar que por vezes as asneiras desmioladas que dos organismos do Estado
chegam à praça, isto é, às manchetes, resultam de muito desleixo, de alguma incompetência e de não pouca irresponsabilidade, como foram por exemplo os casos das «dívidas fiscais» de Herman José, a libertação, medonha e incompreensível, de dois assassinos já condenados ou o caso mediático das escutas telefónicas. Ainda hoje li na imprensa matutina que um juiz do TIC de Lisboa entendeu aceitar a devassa aos computadores do jornal. Tudo isto deixa no ar a ideia de que se pretende tapar o Sol com uma peneira. De facto tanto na PGR, como nos TIC do país, ou no Sporting, por outras razões, parece haver imensa peneiras ou, como diz o outro, quando o mar bate na rocha...

segunda-feira, fevereiro 27, 2006

Sócrates Ralha Com Quem?

Recordo-me bem dela. Chamava-se Lourdes e o marido trabalhava num Banco. Tinha uma filha da minha idade. Foi minha professora na Escola Primária durante quatro anos seguidos. Entrava na sala de aula, numa Escola da Rua dos Combatentes em Coimbra, perto do sítio onde andavam a construir o Estádio Municipal, uma antiga garagem, e não um daqueles edíficios esmagadores do estado novo e ainda vinha lá no átrio e já vinha a ralhar.
Ralhava e batia. Tinha uma palmatória, a chamada "menina de cinco olhos", redonda, com cinco furos e, porque não estava para ser ela a bater, arranjava algumas maneiras de nos pôr a bater uns nos outros. Não havia raparigas. A Escola feminina era na outra porta ao lado.
Sempre me lembro dela quando o engº. Sócrates aparece na Televisão ou o ouço na Rádio. Está sempre a ralhar. Oh! Homem, deixe de estar zangado. O país está mal, mas sempre esteve assim. Procure ser mais simpático e - dessa maneira - talvez nós acreditemos mais em nós mesmos-
Oh! Engº., o sr. nem imagina o esforço que todos tínhamos de fazer para aprender alguma coisa com aquela senhora professora, que, ainda por cima, levava a filha à sala de aula para a exibir, primeiro, porque a miúda era linda e , depois, porque sabia tudo quanto ela lhe perguntava.
O povo não tem culpa de há séculos ter elites desonestas, trapaceiras e ignorantes. Fique calmo. É que, a mim, por exemplo, ainda me custa pensar naqueles quatro anos dolorosos, quase tanto como outros tantos, os da tropa, onde descobri outra cáfila de vigaristas, que, em nome da Pátria, abriam contas frescas nos Bancos da " metrópole".
Oh! Senhor eng., pela sua avózinha, que há-de ter estórias ainda piores que as minhas para contar, sorria, fale em sossego, explique bem as coisas e não dê a ideia ao povo de que "esta coisa de governar é uma coisa muito difícil, temos sempre de estar a gemer..." Vá lá, keep cool".

domingo, fevereiro 26, 2006

Leonor Coutinho

Os jornais dos últimos dias trazem noticiada a grande surpresa: Leonor Coutinho candidata-se à liderança da Concelhida do PS em Lisboa.

Por mim digo: até que enfim!

Era já tempo de esta mulher, verdadeiramente notável, a quem o PS e Portugal devem algumas das mais brilhantes soluções de problemas que agora parecem fáceis - assim como uma espécie de ovo de colombo - resolve enfrentar, dentro do seu próprio partido , todos quantos não lhe desculpam o facto de viver segundo as suas convicções.

O PS de Lisboa entregue a esta Matemática, com capacidades várias no domínio das ciências sociais, particularmente devotada ao próprio partido e à administração pública, será, seguramente, uma força política mais útil aos lisboetas.

Força!

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

ATRIBUTO OU ACESSÓRIO

Era, no antigamente, uma expressão gramatical, quando havia a oração, o sujeito da mesma, o predicado, o complemento directo, cabia ainda o atributo ou acessório. Ocorre-me a propósito da tolerância ou da intolerância: no fim de contas o mesmo, às avessas. Começa logo porque a tolerância não pode ser imposta e a intolerância não deve ser aceite. Lembro-me quando a França decidiu retirar os símbolos religiosos das escolas oficiais os imigrantes muçulmanos reagirem tempestuosamente, apesar de instalados em solo alheio. Podia acrescentar que a inversa não seria possível: nos países muçulmanos os escassos estrangeiros não têm direito a discordar. E os naturais também não!
No entanto, em França, foi possível discutir o assunto e os muçulmanos manifestarem-se contra, enquanto os franceses, católicos ou não, se mostravam indiferentes, salvo os movimentos feministas, que apoiaram claramente a directiva governamental, porque acima da querela religiosa batem-se por direitos humanos e pela igualdade de sexos.
Quando nos anos 60 os jornais franceses levantaram a questão dos «bidonvilles», o problema era sobretudo português, de portugueses, melhor dizendo. A emigração lusa tinha disparado. O imigrante tinha de sobreviver e alimentar a família, deixada em solo pátrio. Parecia difícil, mas em poucos meses as barracas desapareceram e os portugueses realojaram-se e integraram-se.
Hoje os bairros de lata proliferam por cá. Vê-se que não aproveitamos a lição.
Mas a questão, agora, é outra e bem mais delicada: que fazer com a reacção às gravuras?
Ora, nenhuma comunidade muçulmana emigrada se manifesta por si. Nem no país de acolhimento, nem no de origem. As manifs são orquestradas, quer dentro, quer fora. São ateadas por motivação política e não religiosa. O fanatismo religioso muçulmano é sobretudo uma arma
para expandir o ódio pelos ocidentais...
Claro que nós, ocidentais, não somos meninos de coro. Se o fossemos não teríamos ido ao Iraque como fomos e provavelmente já se marcaram lugares nos próximos comboios para o Irão. E que
irão eles fazer?

Estaremos nós a ser empurrados ou estamos nós a empurrá-los?

Ao considerarem-se as gravuras um pretexto parece razoável retirar a carga sobre a liberdade de expressão, posta em causa. Acho que, pelo contrário, se deve aproveitar para definir regras.
Nos últimos tempos houve muita matéria para justificar uma chamada de atenção. Assistimos a um jornal fazer a apologia do patrão, interessado num negócio faustoso. Leu-se o texto de fundo, do director obrigado a mote. E soube-se que a redacção de um jornal foi devassada por um poder que pode pouco em relação ao que devia poder, mas que nem consegue encontrar explicação para a sua inoperância e sem o que o Presidente da República (reparem que eu não falei de bananas!) se manifestasse, apesar dele próprio ter sido devassado e disso ter dado conta!
Há excessos de liberdade e excessos de debilidade. Não ponho em causa o direito de um ilustrador fazer bonecos. Contesto o responsável (editor, chefe de redacção ou director) da publicação, que deve medir e pesar as consequências. A liberdade de expressão consiste muito
na avaliação e responsabilidade.
De algum modo, a questão ocorrida na Lusa é reflexo de falta de controlo. A redacção andou, e provavelmente continua a andar, à balda. Nem chefe nem director coordena o serviço. Redactores e reportagem não podem fazer o que lhes apetece, fazem o que lhes mandam e submetem o trabalho à apreciação da chefia.
Pois é: há chefias que não chefiam, como há procuradores que não procuram onde devem. E destes deviam haver cada vez menos...

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

A Loira da Rua 48 e D. Vitória

Ninguém sabia ao certo a idade da Dona Vitória. Era uma lenda da Rua 48. A propósito dos tempos idos, quando, a noite era desassossegada pelas botas da polícia, pelas batidas fortes na casa de algum vizinho considerado subversivo... Ou, em tempos mais recentes, quando automóveis enormes e pretos circulavam com as luzes apagadas rua acima, rua abaixo, à procura de indíciosde reuniões clandestinas...sempre se falava da D. Vitória.

Uma mulher intrépida, capaz de enfrentar todas as situações. Alta, desempenada, cabelos brancos, presos na nuca, de olhos brilhantes, sempre que passava a Rua 48 ficava em sentido: "bom dia...boa tarde, D. Vitória..."

Tinha sempre uma palavra especial para cada um, às vezes apenas um sorriso cúmplice, que lhe ficou dos tempos das grandes lutas, das manifestações cidade acima na reivindicação das grandes transformações sociais do país depois do 25 de Abril.
Era uma verdadeira líder. Foi ela que mobilizou sempre o povo da Rua para que as autoridades municipais atendessem as suas reivindicações.
Contava-se mesmo que os presidente de Câmara não dispensavam uma visita à casa da D. Vitória, depois de serem eleitos e mesmo antes das eleições. Conta-se também que alguns deles não conseguiram entrar, mesmo depois de eleitos.
Algumas das estórias de D. Vitória eram como que lendas que se contavam no Clube, nas tertúlias familiares ou mesmo de rua, daquelas que se montam em cima de um muro, numa esquina.
Uma destas, por exemplo, explicava com todas as letras como é que D. Vitória tinha escondido um dos netos debaixo das saias, quando a PIDE o foi procurar para o levar sabe-se lá para onde. Nunca o encontraram e levaram mesmo uma corrida quase a pontapé.
A Rua tinha um orgulho especial na sua heroína, na sua D. Vitória.
Ali estava ela, agora, rodeada de flores, com um sorriso de quem cumpriu a sua missão. Mãos colocadas sobre o peito, parecia, ainda que morta, continuar a olhar pelo seu povo, ali reunido para o último adeus.
Lá estava o sr. Cristo, impecável, no seu fato mais domingueiro, de cabelo castanho escuro impecavelmente penteado. Toda a gente se interrogava sobre o segredo daquela juventude, já que ele era dos que contava grande parte das estórias de D. Vitória de tempos idos e difíceis.
O povo também contava que ele, o sr. Cristo - nome com enormes responsabilidades - tinha pedido a D. Vitória para tomar conta, para...educar os seus filhos, mas que estes, preferiram, depois de alguns conselhos de D. Vitória, emigrar. Andam, agora lá pelos Estados Unidos ou pela França.
Hão-de saber, seguramente, ainda que mais tarde, do passamento de D. Vitória, um acontecimento que deixou a Rua 48 completamente entristecida. Sobretudo a Loira da Rua, aquela senhora de quem temos vindo a contar alguns episódios da sua vida, delas e de suas filhas adoptivas, Marilú e Francisquinha.
É que D. Vitória tinha feito dela como que a sua sucessora na liderança do povo daquela rua. Passavam horas à conversa : a D. Vitória sentada numa cadeira de balanço e com um enorme sorriso, a ouvir aquilo que considerava serem as aventuras da "sua menina".
Quando a Loira da Rua 48 entrou no salão paroquial, com as suas duas meninas, cada uma delas com um enorme ramo de rosas, umas brancas e outras amarelas, o povo olhou e grande parte das pessoas que ali estava deixou que lhe caissem algumas lágrimas pela face. No rosto da Loira, habitualmente risonho, feliz, como se a vida se desprendesse dos seus olhos, perpassava uma tristeza desmedida.
Com um enorme cuidado para não dar nas vistas, rosto inclinado para o chão, aproximou-se da urna de D. Vitória e pediu às suas meninas que colocassem junto de todos os outros ramos de flores as suas rosas.
Ela debruçou-se por sobre o corpo da defunta e tirou de dentro de um saco dois cravos vermelhos para colocar entre as mãos de D. Vitória. O salão paroquial como que estremeceu em uníssono por aquele gesto cheio de simbolismo. Estava consumada a transferência da liderança.
A velhinha que sempre diz mal da nora e passa a vida na loja do chinês a pedir ao chinês ainda mais pechinchas, inclinou a cabeça, o sr. alto, bem apessoado, que ao fim da tarde carrega sacos chiques para casa, a senhora que chega ao fim da tarde, meio a cambalear, os barrigudos que tomam conta do clube e vão bebendo cerveja enquanto não chegam os sócios para discutir a vida da instituição, até o sr. Cristo, todos eles inclinaram a cabeça em direcção à Loira da Rua 48.
A D. Ermelinda que só tinha sabido do infausto acontecimento naquela hora, quando entrou no salão paroquial percebeu que, para além da morte de D. Vitória, algo de muito importante se passava e ajoelhou.
O sr. Manuel encolheu a barriga e sorriu.
A Loira da Rua 48 sentou-se numa cadeira, bem à frente de todos, junto a D. Vitória, ficou recolhida por alguns instantes e depois, levantando-se, falou para toda a gente:
- " Morreu uma grande mulher, que sempre esteve connosco nas horas más e nos deixou viver as horas boas. É justo que lhe prestemos a nossa homenagem e saibamos ser dignos da sua história. O povo da Rua 48 não pode trair a sua memória".
Toda a gente assentou com a cabeça. Havia lágrimas nos olhos de alguns dos presentes.
Marilú e Francisquinha olhavam para a mãe admiradas. Nunca a tinha visto tão profundamente emocionada e agarraram-se ainda mais a ela.
Naquele dia começava a estória da liderança da Loira da Rua 48, que os poetas, mais tarde haveriam de cantar.

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

A Loira da Rua 48 Apagou o Incêndio

A Rua 48 foi alvoroçada durante aquela noite de Fevereiro em que o vento tocado a muitos quilómetros por hora deitou muitas das antenas de televisão por terra, destelhou algumas casas e assustou as velhinhas, assim como a D. Ermelinda, que já se habituou aos barulhos estranhos da vizinha de cima, mas nunca imaginou que o vento lhe abanasse a própria cama. Parecia coisa do demo...

Mas mais alvoroçada ainda ficou quando ouviu os carros dos bombeiros a buzinarem rua abaixo , rua acima, e os homens fardados de vermelho a saltar apressados, a esticar mangueiras e a montar escadas, a apontarem com a cabeça e as mãos o cimo de uma das casas, de onde saía uma fumarada.

- "É fogo! É fogo! "- repetiam as pessoas, assim como palavras ecoando em vales: é foooogooo!!!

Na casa da Loira da Rua 48.

Embrulhados em cobertores ou simplesmente vestidos de roupões, alguns deles visivelmente de Verão, visivelmente abertos a deixar ver ou somente antever as partes púdicas... é bem verdade que alguns deles já nem partes têm, mas é só para se perceber a aflição daquela gente quando verificou que o fogo, ou antes o fumo, vinha da casa da Loira da Rua, a sua heroína.

- "Meu Deus.. e as meninas ? como estarão as meninas?" - interrogava alguém, visivelmente aflito.

A D. Ermelinda saiu do prédio com as mãos na cabeça (não se sabe se para se proteger de alguma coisa, se para tentar pentear os trinta cabelos que lhe restam..)

Os bombeiros subiam e desciam e, de repente, começaram a enrolar as mangueiras, donde não tinha saído uma pinga de água, desmontaram as escadas "magirus", entraram nos carros vermelhos a bater as portas e foram para socorrer outras desgraças.

Estava o povo da Rua 48 a ajeitar os roupões, a compor os cobertores, a dar um jeito nos cabelos despenteados ( aquele sujeito que pinta o cabelo às quatro da manhã estava com meia cabeça branca e outra meia castanha...), quando, arranjada como deve estar alguém que se prepara para dar uma explicação à sua gente, a loira da Rua 48 abre a porta e aparece com as suas duas filhas.

O povão correu para junto delas. Ia toda a gente começar a falar ao mesmo tempo... mas ela não deixou. Com um sinal, feito de dedo na boca, ordenou silêncio.

- "Primeiro, eu explico, depois vocês perguntam..."

- "Qual depois...queremos saber tudo e já..."

- "Oh! mulher, quantas vezes já lhe disse para não aparecer em público com essas raízes à mostra. Porque não faz ali como aquele sujeito e não pinta o cabelo às quatro da manhã? E, agora, se querrem saber o que de facto aconteceu. fiquem calados e ouçam..."

Voltou a fazer-se silêncio.

- " - É que eu tinha umas velas junto do retrato da irmã Lúcia e de umas flores e o ventou juntou o que não devia juntar, a chama das velas com o papel da fotografia e as flores. Começou uma grande fumarada e eu, cautelosa, para que a cera das velas e os restos mortais da santa não provocassem alguma explosão, não deitei água, só soprei. O fumo começou a sair pela chaminé e aqui o nosso vizinho, aquele fininho ali, que, mesmo com chuva e vento tem que ir fumar para a janela, resolveu chamar os bombeiros...

- "Mas que santa?" - perguntou a velha encarquilhada que costuma ir discutir preços com o chinês da loja do chinês.

- "A santa Lúcia, pois quem havia de ser... aquela que vai para Fátima..."

- " Mas ela ainda não é santa..." - respondeu a velhota, esganiçando-se ainda mais.

- "Diz muito bem: ainda não é... mas vai ser. A esta hora o Papa João Paulo II está a tratar de tudo lá no céu. Por isso lhe acendi umas velas..."

- "Mas, a senhora podia ter feito isso com luz eléctrica, as velas são muito perigosas..."

- "Oh ! senhor Manuel, o senhor julga que eu estou para encher os pançudos da EDP?. Há muito que só uso velas. Velas que compro no chinês, muito mais baratas que noutro sítio. E a D. Mariquinhas também não deve andar a acender as lâmpadas porque eu também a lá vejo a comprar velas..."

A senhora mais velha que negou a santidade de Lùcia saiu de fininho e fechou a porta de casa devagar, ao contrário do que costuma fazer.

- " E pronto, acabou o comício. Eu e as minhas filhas, apagámos o incêndio com meia dúzia de sopros e assim também não subimos a conta da EPAL. Boa noite. Não se esqueçam de se agasalhar que a noite está fria..."

E lá foi ela, com o seu ar de mulher firme, com as duas filhas, uma em cada mão, para sua casa. Mas ainda teve tempo para ouvir de uma das vizinhas o quão estava espantada por ter descoberto na Loira da Rua 48 uma devota: "é uma santa mulher... é uma santa mulher".

A Loira ficou, todavia, sem saber se a vizinha se referia a ela ou à irmã Lúcia.

domingo, fevereiro 19, 2006

A Rádio do Nosso Descontentamento

Nos últimos anos o Mundo mudou a uma tal velocidade que se demoramos a reparar nas mudanças corremos o risco ser ultrapassados. E mudou de todas as maneiras e em todos os sectores. A vida de hoje não tem nada a ver com a vida de há vinte, quinze, dez anos.
As mudanças tiveram também vários sentidos: houve mudanças boas e mudanças más, mesmo considerando a carga subjectiva da classificação.
A Rádio, por exemplo, do ponto de vista da tecnologia, conheceu diversas revoluções e hoje fazem-se coisas inimagináveis há alguns anos.
Todavia, do ponto de vista da qualidade de quem "faz" essa Rádio servida por uma tecnologia estrondosa, as mudanças foram para bem pior.
E o resultado é uma Rádio praticamente impossível de ouvir, apesar da pureza do som, sem sopros de emissores, sem distorções, sem brancas, sem todos aqueles precalços que faziam da Rádio também uma aventura.
Há, obviamente excepções: Na Antena 1 o Rafael Correia e o José Nuno Martins e na TSF, o Fernando Alves.
Eu deixei de ouvir Rádio sistematicamente, como fiz durante anos. Agora, já nem no carro. Tenho a " minha música" armazenada e é essa que ouço.
Logo pela manhã percorro os diversos noticiários, das diversas emissoras. São todos iguais, muitas vezes com os mesmos erros que se repetem ao longo do dia.
Sempre que tento retomar o velho hábito da Rádio como companhia desisto: do outro lado está alguém - agora são mais vozes femininas que masculinas - a dizer uma vulgaridade, a lembrar-me as horas, a falar do tempo ou do trânsito. Quando arriscam qualquer outra coisa temos piroseira... E isto para não falar da música que nos "obrigam" a ouvir.
Para os momentos em que, por alguma razão, não tenho disponibilidade para a "minha música" sintonizo-me na ClassFM. Aí não tenho que ouvir ninguém e a música agrada-me.
Que saudades da Rádio feita por gente que a fazia como se de um sacerdócio se tratasse e não uma profissão legitimadas por um canudo!!!

terça-feira, fevereiro 14, 2006

A OPA da PT É Um Festival


A VER A OPA A PASSAR?

Quem se lembra do filme «Wall Street» poderá ter uma ideia do que se passa no mundo da Bolsa e neste caso da OPA à PT em particular.

Uma jogada do Passado

Após a fusão da Telecom Portugal (TP) com os TLP, o governo do Cavaquistão iniciou o processo da privatização. A nova empresa (PT) tinha sido avaliada à nascença por um consórcio internacional por 1,2 mil milhões de contos em 1994.
Iniciado o processo de privatização, o governo nomeou uma comissão avaliadora onde se incluia o BES e que determinou o valor total da PT para ser lançado no mercado de 600 milhões de euros. 50% menos, é obra!
E isto foi um escândalo na época, relatado nos jornais, como é que uma entidade avaliadora podia ser depois compradora também. Com isto, o governo de então fez que o Povo Português subsidiasse a fundo perdido com centenas de milhões de contos todos os compradores, tanto na Bolsa de Lisboa como nas de Nova Iorque e Londres. O Estado foi roubado!
Foi também o tempo das ilusões para os pequenos accionistas que ganharam algum dinheiro e acreditaram no disco governamental de então de “capitalismo popular”. Esfumou-se rapidamente.

A Jogada de agora

Se recordámos o que se passou há cerca de 12 anos, é para reflectirmos sobre a actualidade, nomeadamente o caso da OPA presente.
O governo Sócrates «vai pensar» e aguarda a assembleia de accionistas, diz, porque «as regras do mercado estão a funcionar».
Poderia dizer outra coisa agora?
Só “engole” esta quem quer.
Podia lá ser, um negócio deste tipo e tamanho (14 mil milhões de euros) não estar estudado, programado e combinado com o Governo Português, que detem as 500 acções de ouro (“Golden Share”) que podem vetar o negócio da sua vida, ainda por cima vindo da parte de um empresário “apartidário” que sempre tanto tem ajudado os partidos dos governos e que confia agora ainda mais em Sócrates em particular?
Necessariamente, que o governo vai esperar para ver como reage a oposição (BES, Telefónica e outros) e ver “o clima político” para poder ou não aceitar o combinado e preparado há muitos meses atrás e para o que contou com a má gestão da actual Administração da PT.

A “festa” da comunicação social

Como se vê pela comunicação social, “a festa” que vai pelos “especialistas” e “espertos” bem pagos a “botar faladura” sobre os “méritos” da operação bolsista, são já às dezenas e todas convergem numa coisa, o Povo Português e os trabalhadores da PT, assim como as suas organizações representativas, CT e Sindicatos, os milhões de clientes parecem arredados de tudo, apenas reservados ao papel de espectadores para «Ver a Banda Passar».

Vai haver contra-OPA? Não vai? Gritam sorridentes os “especialistas” ou “voz do dono”, pagos pelos donos do “festim”. Veja-se a censura ferrea que todos fazem a quem está dentro do assunto e não alinha com eles. Foi o que aconteceu no programa dos PRÓS da RTP. Dos 6 convidados, 5 pareciam a voz do sr.Azevedo.
O que é importante para eles?
Por exemplo, já sabemos pelos jornais, que o pai do sr.Azevedo era carpinteiro e a mãe modista, o homem trabalha 10 horas por dia, mesmo quando não está a fazer nada, contos de fada que fazem comover alguns corações, história igualzinha à de tantos milionários de negócios normalmente pouco claros.
Além disso, dizem os “especialistas”, trata-se de um grande grupo português, mesmo que para isso seja preciso “nacionalizar” o grupo francês ligado à Distribuição (Continente), a France Telecom e o dinheiro do financiador Banco Santander, o que é muito “patriótico”.

Afinal quem perde?

O emprego para milhares, o fundo de pensões, a PT-ACS (saúde), o AE, a estratégia nacional do sector, o desfazer do grupo PT e a sua venda a retalho para obter mais valias de muitos milhões, a concorrência, o ainda serviço social existente de telecomunicações, a I&D nacional (Centro de Estudos de Telecomunicações), etc, tudo isto está posto em causa nesta operação.
E claro, nesta altura em que tudo ainda se desenrola sem certezas, “as garras” ainda estão encolhidas até ao negócio se fechar, com OPA ou contra-OPA.

Porque que é que isto aparece?

A média europeia do PIB (produto interno bruto) entregue a quem o realiza, os trabalhadores, é 51%. Em Portugal é 40% (estatísticas da UE)
. Pois, 60% vai para os bolsos de pessoas como o sr.Azevedo.
O chamado neo-liberalismo ou capitalismo selvagem que os sucessivos governos, têm aplicado ao País há 30 anos e que em períodos eleitorais negam ou dizem combater, conseguiram levá-lo aos poucos, primeiro para o último dos 15 da UE e depois da entrada de mais 10 países, a curto prazo de ser o último dos 25 da UE.
Em que bolsos param os milhares de milhão de euros que a UE entregou a Portugal desde 1986?
Para isso, Portugal contou com homens como o sr.Azevedo, empresário bem cotado entre os 300 melhores milionários do mundo para o que precisa de operações como esta de desfazer a PT, para a venda ao retalho a quem der mais, como já disse. Nem um tostão o sr.Azevedo vai arriscar do bolso dele.

É por isso que esta operação relembra a acção do filme «Wall Street», onde homens virados para jogadas milionárias da Bolsa, podem comprar empresas, desfazê-las, revendê-las aos pedaços ou mesmo fechá-las para diminuir a concorrência de outras, completamente indiferentes, ao povo, aos trabalhadores, às familias e a tudo o mais que não seja o seu lucro imediato.

E as 500 acções de ouro e a consequente blindagem dos estatutos da empresa, uma das defesas contra a destruição da PT, dependem neste momento de um governo escolhido por muitos portugueses pelas abundantes promessas que realizou.
Não te deixes ficar «A VER A BANDA PASSAR»!
AA
REPRODUZO AQUI UM TEXTO E UMA FOTO QUE ME CHEGARAM VIA E-MAIL

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

ABAIXO DE CÃO

Era apenas um pasquim. Passou a escarro. É um nojo. Pior: nem tem direito a existir, apesar do senhor Jorge ter uma ideia obsoleta do que é a liberdade de expressão, escrita ou falada. Fui a Lisboa e vi, à saída do comboio aquela coisa peçonhenta, no meio de jornais e revistas. Nem quis acreditar. A negação completa do que é e como se faz uma notícia sobre um atentado criminoso perpetrado conta uma mulher. Apenas li que um conhecido cadastrado, cujo nome não vi, nem sei se constava do primeira e única página que vi, havia raptado e violado uma mulher, cujo nome e foto eram manchete. É reles. É bem pior que roubar carteiras; é pior que traficar droga. Não há tamanho para tamanha filha de putice.
Se o inquilino de Belém, ilustre defensor da liberdade de expressão, quiser voltar ao assunto aproveite. Lembre que ninguém tem o direito de qualificar o «presumível» criminoso, o qual até ser julgado e «eventualmente» condenado tem direito ao bom nome. As vítimas não! As vítimas servem de pasto e capacho a essa gente foleira que trabalha para alguma imprensa.
É diferente, eu sei, dos bonecos dinamarqueses. Não é a religião, seja qual for, que se põe em causa, mas o efeito que a gracinha pode ter para terceiros e, sobretudo, o aproveitamento vil
que se pode extrair, o que evidentemente se verificou.
Até as vítimas que não foram da Casa Pia merecem respeito. Merecem ser preservadas. Mais do que merecer têm esse direito. Direito legítimo não vende papel. Nem tudo que vende papel se justifica e pode ser aceite, melhor dizendo: tolerado.
O caso de hoje exige medidas. Não folclóricas, nem demagógicas: duras, muito duras. O fecho compulsivo, e definitivo, do pasquim ainda assim seria suave. Director e editor, pelo menos, deviam ser banidos da Informação. Pocilga com eles.

domingo, fevereiro 12, 2006

O Bloco Central dos Interesses

A notícia não podia ser mais clara: o governo prepara-se para vender o património da Casa Pia, avaliado em mais de mil milhões de euros. Todavia, uma avaliação feita há uns tempos atrás baixa substancialmente o valor para 220 milhões, valor com que a chamada comissão instaladora está a trabalhar.
Não sendo estas as principais questões que o eventual desaparecimento da Casa Pia de Lisboa - porque é para lá que caminhamos - levanta, vale, todavia a pena analisá-las antes de tentarmos perceber as razões por que um ministério governado por um homem aparentemente sério, de um governo socialista, cuja ideologia tem que ser profundameente marcada pela solidariedade com os mais desfavorecidos, decreta a venda de um património que vem sendo acumulado desde 1780, sendo que muito dele é produto de dádivas de cidadãos, preocupados com a educação dos desprotegidos.
Este esquema, agora concretizado em Decreto Lei, começou a ser gizado no tempo do governo de Durão Barroso, que nomeou a tal comissão para avaliar a situação da Casa Pia, na sequência do escândalo da pedofilia.
E o que fez tal comissão? Nada! Trabalhou em cima de uma realidade que já não existe há anos na instituição,como por exemplo as camaratas, não ouviu os agentes de ensino e educação dos vários colégios e, depois de muitos euros gastos, em estudos, viagens, contratos espúrios, tirou da cartola a solução: há que reduzir o número de alunos, logo há que reduzir a estrutura, em consequência, há que vender.
Tudo muito lógico para quem, percebendo a extensão do património existente vê nele uma fonte de rendimentop e não um instrumento para melhorar cada vez mais as condições de educação das crianças cujas famílias não sabem ou não podem proporcionar aos seus filhos as mesmas oportunidades dos outros , que vão, normalmente, às escolas ou frequentam os colégios privados.
A intenção da realização de mais valias com a venda do património também é evidente na subavaliação do património. Por exemplo, diz o Conselho dos Ex-Alunos, entretanto extinto pelo Decreto Lei que cria uma comissão chamada instaladora, mas que é, de facto, uma comissão liquidatária, o Colégio Pina Manique, junto ao Mosteiro dos Jerónimos não vale apenas os seis milhões de contos mas, pelo menos 60 milhões!!!
O interesse dos negócios sugeridos por toda esta trapalhada une, mais uma vez PSD e PS, tendo pelo meio alguns membros do CDS, como Roberto Carneiro, presidente da Comissão técnico-científica para a reestruturação da Casa Pia e donde saíu a ideia da redução de alunos.
As pessoas que têm acompanhado este processo esperavam do actual titular do Ministério da Solidariedade, Vieira da Silva, uma outra atitude: que não fosse pressionável pelo bloco central dos interesses e avaliasse a Casa Pia como uma instituição com um potencial de crescimento impressionante, no seu objectivo de garantir a todos os jovens desprotegidos uma real protecção do Estado.
Mas não, numa altura em que se assiste à degradação acelerada da família e ao aparecimento de crianças pobres, sem protecção, sem perspectivas futuras que não sejam a marginalidade, um governo socialista apadrinha os intentos mais egoístas de uma direita troglodita, interessada apenas em sacar o mais possível ao Estado.
E os portugueses - mais uma vez mal informados ou completamente desinformados, porque quando ouvem falar da Casa Pia só se lembram da pedofilia - vão assistir ao desmantelamento de uma instituição que pode, muitas vezes, ter sido mal governada, mas que, se obrigada a cumprir os seus objectivos, pode ser motivo de orgulho para todos nós.

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

A Loira da Rua 48 Vai Ao Porto

Com as duas filhas pela mão - Marilú na direita e Francisquinha na esquerda - tem sido sempre assim, desde que as crianças chegaram da Suécia, a Loira da Rua 48 entrou no grande átrio da Estação de Santa Apolónia e foi directa aos guichets de venda de bilhetes.
- "Quero um bilhete para o Porto..."

-"Em que combóio? Para que horas " - perguntou a senhora do outro lado.

-"Olhe, no que ande mais depressa e saia mais cedo..."

- "As meninas também têm que pagar..."

- "Isso é que era bom!... as minhas filhas têm este ar robusto, mas são novinhas, não têm idade para essas coisas... Vá, vá, um bilhete rápido, que estou com pressa... quero apanhar o major antes de ele sair de casa para a Câmara...

Do outro lado do guichet a funcionária da CP abriu os olhos de espanto.

-" Sim. Quero fazer umas perguntas áquele senhor que aparece na televisão todos os dias a dizer que é inocente de não sei quantos crimes de que é acusado, por causa do futebol..."

- "Então e vai meter-se nessa confusão, com as meninas... coitadas"

- "As minhas filhas têm que aprender como defender-se destas coisas, além disso elas gostam de viajar..."

A Loira da Rua 48, já na posse do seu bilhete, ultrapassou as portas da estação e dirigiu-se para a linha nº2, onde estava estacionado o pendular - aquele que vai para cima e vem para baixo.

Sentou- no meio das duas filhas e foi apreciando a paisagem. Reparou que a maior parte dos campos estão vazios, que há casas e rotundas por todo o lado, que em Coimbra já quase não se vê a torre da Universidade. Até que chegou ao Porto. Campanhã. Chamou um Taxi e disse ao homem: "leve-me por favor e rápido, a casa do major".

O taxista nem perguntou a identidade do tal major. Pensou logo que se tratava do capitão batata. Ainda se lembrava do escândalo, andava na tropa por essa altura...

O mais rápido que poude, despejou a senhora loira, altiva e bonita, mais as duas crianças, junto à vivenda de muros altos e portões metálicos, que naquele preciso momento começaram a abrir. Houve um movimento inusitado: homens com câmaras às costas e mulheres de microfones nas mãos aproximaram-se...


A Loira da Rua 48, com as duas crianças pela mão, postou-se à frente daquele bruto automóvel preto. Lá dentro, o major agitou-se. O motorista buzinou e ameaçou avançar com a máquina. As câmaras filmavam e os microfones esticaram-se. O major saiu do automóvel.

- "Então e a senhora quer o quê, mais essas criacinhas tão lindas?...Sabe que a campanha já acabou, agora já não estou a dar frigoríficos, nem televisões, nem coisa nenhuma, agora estou a ver se ganho para poder, daqui a alguns anos, voltar a oferecer uns electrodomésticos..." disse o major com aquele sorriso irónico que se lhe conhece dos tempos de antena de que usufrui.

- "Eu sei...eu sei disso tudo... -disse a loira, afinando a voz por causa dos microfones - eu e as minhas filhas viemos da Rua 48, de Lisboa, e estamos aqui para lhe dizer o seguinte: não apreciámos particularmente que se tenha dirigido ao Presidente da República em termos menos respeitosos... não estamos a gostar dessa estória de corrupção por causa do Gondomar... o que nós queremos saber é das outras, com o Boavista, com o Porto, com o Benfica...Andam a enganar-nos ou quê?..."

As câmaras continuavam a filmar e havia já uma multidão de microfones à frente da Loira da Rua 48. A Marilú e a Francisquinha estavam um pouco assustadas, mas a mãe, enquanto falava, puxava-as mais para si.

- "Então, a senhora vem de Lisboa, da célebre Rua 48, para ralhar comigo por causa do Gondomar...?

- "Não se faça desentendido, homem... não é por causa do Gondomar... é por causa de todas as outras trafulhices e, sobretudo por uma outra razão: então o senhor movimentou influências políticas para levar o tal Pnto não sei das quantas com o Durão Barroso a Moçambique. Oh! senhor, foi por isso que o homem ficou maluco. O Barroso sempre foi má companhia, nem em Moçambique ele perdeu esse mau hábito..."

Dito isto, a loira voltou as costas ao automóvel e encaminhou-se para o taxi, que, entretanto, perante tal aparato, tinha ficado à espera. Os pés de microfone vieram todos a correr e as câmaras colocaram-se à frente da loira da Rua 48, que, de repente, parou. " E vocês, querem o quê? porque é que não aprendem a fazer perguntas a estes sujeitos e estão sempre a perguntar o mesmo: como se sente?.... E se me deixassem passar?

Entrou no Taxi e seguiu para a estação da CP. Um combóio haveria de a trazer de volta a Lisboa.

Quando ao fim da tarde regressou à Rua 48, o pessoal começou a juntar-se para a receber em apoteose, porque as televisões todas tinham passado na íntegra a sua intervenção junto do major.

Um dos vizinhos, aquele que tem sempre sacos de lojas "in", perguntou: " porque é que a senhora não falou do Sporting?"

-" O Sporting é um clube honesto, ouviu?". Uma grande salva de palmas sublinhou a afirmação. Ficaram todos contentes.O pessoal da Rua 48 é todo- ou quase - do Sporting.

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

A Manipulação

Há algumas manipulações agradáveis, daquelas que pressupoêm as mãos, macias, de preferência, mas, em matéria de manipulação na comunicação social, o que está a acontecer em Portugal, a propósito da OPA de Belmiro de Azevedo sobre a PT merecia, pelo menos, uma reprimenda da alta autoridade para a comunicação social - afinal a única pena de que há notícia relativamente a todos os atropelos cometidos pela dita... incluindo atropelos às leis de publicidade.
O jornal "Público" de hoje traz na primeira página uma notícia verdadeiramente "criminosa", porque afirma que o Governo não gostou da posição do Conselho de Administração da PT, relativamente à OPA da Sonae e acrescenta uma série de outras "barbaridades"que são, obviamente, pressão do patrão da Sonae, igualmente dono do "Publico", sem citar uma fonte.
Esta notícia foi repetida por várias rádios e vários televisões, sem um vírgula alterada...
Há um outro jornal de economia que afirma, peremptoriamente, que o governo irá contra a Autoridade para a Concorrência, viabilizando a fusão das duas empresas de telecomunicações móveis - a TMN e a OPTIMUS. Quem acredita?
O que surpreende é o facto de a PT ter revelado, ao longo dos últimos anos, uma enorme capacidade de manipulação da comunicação social, através da agência de Líbano Monteiro, que colocou, inclusivé, parte da sua gente na estrutura interna de comunicação da PT - incluindo o seu director central, Abílio Martins, e agora se mostra completamente manietada, sem conseguir contrariar os argumentos daqueles que parecem ser os seus adversários.
Será que a JLM já se passou?

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

OPA De Quem?

Não posso deixar de me admirar com o que ouço e leio ácerca da "repentina"opa de Belmiro de Azevedo sobre o Grupo Portugal Telecom (PT). O espanto dos jornais, das televisões e das rádios. O que aí vai, Santo Deus!!!...
Mas, senhoras e senhores, o plano não é novo: a primeira vez que ele foi tentado foi por volta de 1996, quando era ministro da tutela das telecomunicações o engº. Cravinho e Secretária de Estado da Habitação e Telecomunicações, Leonor Coutinho. Murteira Nabo já era Presidente da Portugal Telecom.
Belmiro de Azevedo arquitectou o projecto de juntar a France Telecom e a DeutcheTelekom, para, com ele, então concorrente a uma das licenças de operador móvel, tomarem conta da Portugal Telecom. Foi então que a operadora nacional, por inspiração da Secretária de Estado, arquitectou a estratégia de se aliar, em simultâneo, à Telefónica e à British Telecom.
Os anos passaram, a PT foi completamente nacionalizada, com a excepção das 500 acções "golden share", que dão ao Estado a possibilidade de votar contra decisões estratégicas ( entre as quais a escolha do presidente do Grupo) e Belmiro regressa com o seu plano.
Com uma diferença importante: a France Telecom não tem condições para se juntar a ele, porque os resultados negativos dos seus últimos exercícios obrigaram a uma intervenção do Estado francês.
Sem a France Telecom, a Deutchetelekom está no céu e assume sózinha o papel das duas. Belmiro enverga as dragonas do cavaleiro português, o Banco Satander, a troco de um grande comissão, aceita passar o cheque e aí está o "circo" montado. Tanto mais que a PT, entretanto, se espalhou pelo Mundo e dispersou activos por mercados de rentabilidade impressionante.
Belmiro garante o interesse nacional e não sei que mais, já aceita a "golden share" e as duas redes, mas toda a gente sabe que ele compra para vender. Compra em grande e vende a retalho. O interesse da Deutchetelekom está na rede fixa, para tomar conta do mercado ibérico.
É aí que a porca torce o rabo, já que a Telefónica sabe que com a Deutchetelekom em Portugal tem o seu próprio mercado interno ameaçado.
Estamos a assistir a um a luta de gigantes na nossa pequenina bolsa. Veremos quem ganha. Uma coisa é certa: aqueles que se bateram para que o Estado ficasse pelo menos com 25 por cento do capital da Portugal Telecom estão a ser derrotados todos os dias.
Nesta OPA também fica, por outro lado, evidente, o papel permanentememte negativo do BES, que, com os seus jogos escuros - e às vezes sujos - manteve a cotação das acções da PT a níveis tão baixos que hoje permitem ao engº Belmiro vir oferecer a ridicularia de 9,5 euros por cada acção.
Talvez esta luta de gigantes sirva para demonstrar o verdadeiro valor accionista do maior grupo empresarial português, que - diga-se em abono da verdade - tem sido dirigido por oportunistas que apenas pensam em si e nas suas próprias contas bancárias.
Portugal como Estado com capacidade para orientar a sua vida e determinar a dos seus cidadãos está a desaperecer aos poucos. Fica apenas o espaço - bonito, bonito, mas sem poder ir à mesa.

terça-feira, fevereiro 07, 2006

NÃO FAZEI ONDAS...

Alguns jornais, pasquinados ou afins, entenderam denunciar, como vileza, que o primeiro-ministro dispunha de uma «Secreta» secretíssima. E tanto que só ele,Sócrates e os jornais é que sabiam. Também sabiam os polícias vulgares de lineu. A minha avó não sabia, juro que não sabia, de contrário ela havia de me ter contado, a mim e às dezassete amigas que ainda conserva. O neto dela borrifa-se. E mais: acha muito bem que o chefe do governo governe com terra à vista e possua a sua (dele) Companhia de Investigação Avisada (convém uma sigla discreta!) longe do Parlamento. E por uma razão simples: se o Parlamento soubesse da «Secreta» não seria secreta porra nenhuma. Conhecem, vossas mercês, algum deputado que não fale (cá fora) muito ou demais? Bom... e lá dentro? Entre muros sussurram por todos os corredores. Cada um deles haveria de exigir dois «secretas» só para si. Um para vigiar a direita e o outro para circunscrever, ou coisa parecida, a esquerda. Do centro já ninguém quer saber. Estão a ver: lá se
ia o santo equilíbrio orçamental...
Era bom, sim senhor, que Sócrates dispusesse de uma «Secreta» desconhecida, atenta aos devaneios de alguns nuevos ibéricos que por aí cirandam aos vivas e aos olés ou à multiplicação de coelhos ruidosos e seus acoelhados estratégicos. Novas seitas, novos bandos a exigir cautelas e caldos de galinha, convenientemente secretos.
E, claro, escutar, escutar imenso. Sobretudo magistrados, juizes e similares, designadamente adjuntos e equiparados. Convirá, de vez em quando, escutar o inquilino de Belém, não vá ele amuar por ser deixado de fora! E, bem entendido, ouvir especialmente o primeiro-ministro, ele mesmo, de modo a testemunhar que ele nunca diz nada - só fala!
E tenho dito.
A Bem da Nação
O cronista ateu, que não é venerador nem obrigado.

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

PIROTECNIA

Se sobrar um bocadinho já deverá estar cheio, se eu lá chegar... Assim como assim os filmes tem de ter um fim e o nosso vai acabar cheio de fumarada e com o que sobrar do Globo a cheirar mal!
Com os pobres a deixar de precisar e os ricos a carpir. Não me compreendam mal. Não estou de mau humor, nem sequer chateado. Já tenho idade para estar conformado, mas não sou vaidoso a ponto de acreditar que comigo Irão todos embora.
O que acontece é que cada vez mais percebo menos. Não percebo a razão pela qual os iranianos não podem armar uma bomba atómica. Ou duas! Se os outros têm porque carga de água eles não podem ter?
Podemos lembrar que as únicas que, ainda fresquinhas, cairam sobre cabeças de gente eram americanas!
E não foi por boa causa. Não foi para pôr termo à guerra, como se pretendeu fazer crer. Os japoneses já andavam a tentar junto da diplomacia europeia a rendição, mas os americanos
estavam desesperados por experimentar o novo brinquedo e com isso impressionar os chatos dos russos.
Impressionados ou não, os russos não perderam tempo. Também tinham prisioneiros eruditos e sabiam comprar ambiciosas criaturas. Com bombas dos dois lados a ameaça reduzia-se. Mas depois os ingleses; mas depois, os franceses... e depois outros...e outros. E as experiências calamitosas e irresponsáveis! Perdemos um fotógrafo por causa disso. Estava, com o seu aparelho-photo, num barco pacifista, que denunciava a ameaça anti natura. E o barco explodiu. Um par de secretas gauleses pouco dotados deixou tantas pistas que foi capturado. E foi julgado e condenado. Nunca soube o que aconteceu ao macho, mas a fêmea foi para uma ilha, onde podia ter visitas e onde engravidou e com esse suplemento humanista foi autorizada a ir cumprir o resto da pena na sua terra natal, onde, bem entendido, não cumpriu nada!...
É esta gente criteriosa, pacifista, civilizada que dá bafo sobre a conduta dos outros. E como pacifistas e civilizados «somos nós todos ou ainda menos», apreciamos a liberdade de expressão
«desde pequenos». Vai daí toca a fazer bonecos. Acredito piamente que qualquer dinamarquês tenha o mesmo direito a ser estúpido como qualquer vizinho dele, mais ou menos distante. Podia-se limitar a ser contra o aborto. O problema é que o «plástico» de pasquim é irresponsável e não pode ser responsabilizado. Em vez de fazer bonecos podia vir para a Televisão lusitana ou para o «Diário de Notícias» e outros sítios onde a estupidez desaforada
não paga imposto. Pessoalmente não tenho a mais pequena simpatia pela religião, qualquer que seja. Temos boas razões de queixa da ocidental para nos permitirmos criticar a dos vizinhos.
Acho que sim. Acho que está a chegar a hora. As civilizações não são eternas. Se ainda houver espaço para outra, que seja fina e saiba de paz...

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

A Tábua Rasa da Recuperação Económica

A Recuperação económica tem sido o livro nunca acabado de todos os governos dos últimos trinta anos. Nunca acabado porque não escrito e nunca acabado por nunca lido. É um eterno recomeço de escrita e leitura.
É um dos nossos males: sempre que chega alguém ao poder age como se para trás não houvesse nada. O seu objectivo é a montra dos quatro anos seguintes. Quer chegar ao fim da legislatura e ter argumentos para voltar a ganhar eleições.
Nas últimas semanas o governo de Sócrates tem anunciado programas em cima de programas, tendo em vista a tal recuperação económica. E em que consistem tais programas? Na criação de novas empresas, na concessão de créditos para coisas novas, para gente nova. E as outras, e os outros ?
Aqueles que tiveram que suportar nos últimos anos as sucessivas crises, fruto de más políticas, de má governação e que se veêm, de repente, como espectadorees de um novo circo, de um novo filme em que o seu enredo nem sequer conta.
Que fazer com as empresas (pequenas e médias) que, em consequência dos sucessivos maus anos têm dificuldades tremendas com o fisco, com o pagamento de salários, com os custos das reestruturações?
Os empresários, que bem ou mal, foram cumprindo, assumindo compromissos, explicando as razões por que não os puderam cumprir todos, ouvem falar em planos de reestruturação da Banca - com lucros obscenos - das grandes empresas, que criam cada vez mais desemprego e não descobrem na pantalha dos novos planos do novo livro, nada que os possa ajudar. Pelo contrário: é em cima deles, dos pequenos e médios empresários que o fisco e a segurança social avançam como justiceiros do apocalipse, sempre em nome dos novos escritores do grande livro da recuperação económica. Um livro já sem leitores.

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

ESCUTA

De manhã, com Sol e sem vento é uma festa. Sento-me tranquilamente no quintal e leio qualquer coisa que tenha à mão. Entrevi por entre folhagem uma vizinha que foi depositar sacos de plástico no tambor do lixo. No retorno cruzou com um vizinho, adivinhei um enorme sorriso e ouvi um estridente «bom dia, vizinho!», que ripostou qualquer coisa sobre o dia bonito. Palpitou-me um blá-blá comprido, enquanto eu ia lendo qualquer coisa sobre abusos com as escutas telefónicas e ouvi a vizinha: «Oh! sabe lá! Isto está cada vez pior. Estes gordos até o lixo espalham! É lixo por todo o lado e o contentor está um nojo! E não há ninguém que lhes diga nada.... É uma nojeira é o que é!... E a sua senhora como é que vai?» Nem percebi a resposta mas voltei a ouvir a vizinha: »O vizinho está enganado... aquela dali é uma sonsa... é que ela é... Não se deixe ir nissso»...
Voltei ao pasquim e à zanga de Pinto da Costa com os adeptos violentos e de repente escutei: «Este, aqui, é um chato, um mal encarado, mal diz bom dia. Só pensa nos cães. Parece que todos lhe devem e ninguém lhe paga!»...
O «este,aqui», o «mal encarado» sou eu, mesmo dando de barato que eu não sujo o contentor e que os meus «bons dias» para a «sonsa» do outro lado da rua costumam ser bem cordiais, que evito os «gordos» e não deixo que os cães mijem nas plantas dela. Mas lembrei-me da minha avó:«não sejas malcriado, não se ouve a conversa dos outros... Não te esqueças que quem escuta de si ouve»...
Fiz barulho com as páginas do jornal e sorri ante o súbito silêncio e o fim da conversa «Adeus, vizinho»...
Conversas de campo são como as notícias nos jornais: acabam sempre no mesmo! Porque a zanga sobre as escutas telefónicas perderem o senso. O que se sabe dessas «conversas» são em geral fugas de informação. Não é assunto para badalar na praça pública. Farto-me de ouvir telefonemas, quando vou de comboio para Lisboa. A última que escutei, quase escandalizado,
foi a de uma jovem senhora, muito desenvolta. Quis lembrar-me, aqui, do que ouvi, mas a única coisa que me lembro é que a sujeita era bem interessante, «apelativa», como diria o meu avô se fosse vivo!Caramba, ricos!, com uma beldade daquelas para quê um telefone? Comunicação só por sistema braile...
Não há já nenhum personagem importante, mesmo que seja corrupto, que faça hoje em dia, ou receça, telefonemas comprometedores. «Engates» ainda vá que não vá, mas negociatas!? Tá quieto!
Pasma-se com a informação que se vincula através dos jornais, sobretudo a que previne a delinquência e os delinquentes dos propósitos das autoridades. E pasma-se mais justamente por
se poder desconfiar que parte dessa informação é «vendida» ou irresponsavelmente divulgada.
Já lá vai o tempo em que o segredo era a alma do negócio...